Obediência vem do latim obediscere, submeter-se à vontade de outrem e executá-la. É a ação de realizar a ordem dada por um superior, equivalendo à aquiescência, tácita ou expressa, em face de um determinado comando.
A ideia foi particularmente acentuada pelo paternalismo e pelo absolutismo, gerando o modelo do hábito de obediência dos súditos em face de uma entidade superior, o soberano. Outra é a perspectiva da obediência pelo consentimento, onde aquele que obedece apenas o faz relativamente aquilo a que dá consentimento, pelo que, de certa maneira, obedece a si mesmo, assumindo-se, ao mesmo tempo, como súdito e soberano, isto é, como cidadão. É esta a perspectiva do consensualismo. Do mesmo modo se procura a autoridade, aquele que procura a obediência espontânea.
O normal numa comunidade política é a obediência espontânea exigida pela sociabilidade, pelo sentimento comunitário, pelo interesse individual de obedecer e só depois pela coação, tanto a psicológica, como a virtual ou em potência, dita coercibilidade, ou coação potencial. Logo a coação pode ser entendida como uma afirmação da liberdade. A autoridade deve ser obedecida em consciência, isto é, da maneira como os homens livres obedecem e no interesse do bem comum. O animal apenas tem obstáculos naturais, não tem liberdade e não sente a coação.
A coação defende a liberdade contra o arbítrio, mas a coação só será válida se for o instrumento da aplicação de um direito válido e um direito válido é aquele que recebe o seu fundamento e encontra o seu limite na consciência ética, será esta também o fundamento e o limite da coação aceitável. Quem manda, manda, sobretudo, pelo reconhecimento daqueles que estão sujeitos ao mando. Porque todo o poder tende a ser um ofício, um simples poder-dever. Penetra-se assim na zona da autoridade, onde a obediência pelo consentimento é bem diferente da obediência pelo temor.
A autoridade é assim a qualificação para dar uma ordem distinta de o simples poder que é apenas a possibilidade de ser obedecido. Já não se trata de um domínio servil, produto do pecado, mas antes de um domínio político, que já exige legitimidade.
O mais poderoso de todos os homens não será suficientemente poderoso, se não souber converter o seu poder em direito e a obediência dos outros em dever. Porque a força é uma potência física, de cujas atuações não podem resultar nenhuma moral. A única coisa que torna poderoso aquele que manda é a obediência daquele que obedece.
Contudo, saliente-se que, na perspectiva do absolutismo, é a obediência que faz o imperante. O soberano é absoluto porque não está limitado a não ser pela sua própria vontade. Não está limitado pelo direito, porque é ele que cria o direito e nem sequer está dependente das próprias leis que edita.
Porque aquilo que o príncipe quer, aquilo que o príncipe diz, tem valor de lei, o direito deixa de serem fundamento e limite do soberano. Também a soberania é vista como um circuito direto de comando, sendo determinada pela adesão ou submissão de um povo relativamente ao seu governo. Por outras palavras, a qualidade soberana, afinal, nasce de um hábito de obediência de uma determinada sociedade em face de um superior.
A obediência não se refere tanto à ação externa quanto à ação interna. Donde resulta que quem está mais submetido a outro, é quem decide com toda a sua alma obedecer- lhe em todos os seus preceitos; assim, quem tem a máxima autoridade, é quem reina sobre os corações dos súditos. É a mera possibilidade de alguém impor a sua vontade a outrem, mesmo contra a vontade dele, implica a probabilidade de se encontrar obediência, que haja a presença efetiva de alguém mandando eficazmente em outros. O comando não é necessariamente legítimo, nem a submissão é obrigatoriamente um dever, já a obediência fundamenta-se no reconhecimento, pelos que obedecem das ordens que lhe são dadas, isto é, tem de haver consentimento.
Por seu lado o cerne da política estava na relação entre a resistência e a obediência: o cidadão pela obediência assegura a ordem; pela resistência assegura a liberdade, dois termos que não seriam opostos, mas sim correlativos, porque não há liberdade sem ordem e a ordem de nada vale sem liberdade, pelo que haveria que obedecer resistindo, porque um homem livre contra um tirano, tal é a célula da política, isto é, obedecer em corpo; jamais obedecer em espírito; ceder absolutamente e, ao mesmo tempo, resistir absolutamente.
Leo Gomes